quinta-feira, 20 de janeiro de 2011

Energia

Barragem de Castelo do Bode tem seis décadas
Foi num domingo, 21 de Janeiro, que, faz agora 60 anos, o Presidente da República de então carregou no botão que accionou a “complicada aparelhagem” que, em nove minutos, levou luz eléctrica da barragem de Castelo do Bode para Lisboa. Entre a multidão que naquele dia se concentrou junto à maior obra de engenharia do país, Manuel Oliveira, residente em Martinchel (Abrantes), aldeia vizinha da barragem, era um dos operários que sentia aquela como uma obra sua.
“Comecei a trabalhar lá quando tinha 16 anos” (as obras iniciaram-se em 1946), disse à agência Lusa.
Hoje com 80 anos, recorda a enorme transformação que a massa de betão que travou as águas do rio Zêzere provocou na região.
“Foi um bem que as pessoas naquele tempo tiveram. Foi um Deus que veio do céu. Aqui vivia tudo isolado”, afirmou, lembrando também o muito emprego criado.
Manuel Oliveira começou por trabalhar na construção do bairro que acolheu os operários e depois, quando começou a erguer-se a enorme parede de betão, com 115 metros de altura, acompanhava os técnicos do Laboratório Nacional de Engenharia Civil na colocação dos aparelhos que iriam permitir fazer a observação do comportamento da estrutura.
Considera-se, por isso, habilitado para garantir que esta barragem ficou tão “fixe” que “não tem hipótese. Só um terramoto ou um caso de guerra a deitam abaixo”.
“Doutra maneira, aquilo está sólido até ao último ponto”, garante.
Daqueles tempos guarda alguns episódios de tristeza, como a imagem dos quatro homens que morreram quando se partiu um dos cabos da “vagona” que descia um dos poços feitos quando se criou o túnel que permitiu desviar o rio.
“Eram homens do Norte. Vinha muita gente do Norte à procura do ganha-pão, que naquele tempo havia muita falta”, disse, referindo que houve “bastantes acidentes” porque “não havia segurança no trabalho como hoje”.
Debaixo da água que começou a subir em Abril de 1950 ficou “muita, muita coisa”, sobretudo oliveiras e pinheiros, mas também algumas casas.
“Em Rio Fundeiro, perto de Cernache de Bonjardim, ajudei a tirar umas pessoas e os bens para não ficarem debaixo de água, porque as pessoas não tinham chegado a acordo com a empresa (Hidroelétrica do Zêzere) para saírem, por causa das indemnizações”, disse.
Ficou também a memória das “romarias” de curiosos que, sobretudo nos dias “12 e 13 dos meses de ir a Fátima”, vinham ver a obra e do camião que trouxe a primeira turbina desde a fábrica da Sorefame e que demorou oito dias a chegar à barragem.
O camião tinha “28 rodas” e obrigou a reforçar as pontes por onde passou, porque “as que havia não tinham resistência”, disse, lembrando a chegada dos jornalistas para a reportagem de “uma coisa fora de série”.
Aníbal Anjos foi um dos repórteres que rumou à grande obra em Outubro de 1949, descrevendo, no “Cidade de Tomar”, o “cenário grandioso da engenharia moderna” que surgia à sua frente.
Salientava os seis meses de avanço da obra, graças ao trabalho “ininterrupto” de uma “legião de engenheiros e operários, das mais variadas nacionalidades”, sublinhando que no início dos trabalhos chegaram a trabalhar ali 4.000 operários, entretanto reduzidos para 1.000 “por já não serem necessários tantos braços”.
A cerimónia de inauguração é descrita, na edição de 28 de Janeiro de 1951 do “Cidade de Tomar” como “o mais extraordinário acontecimento dos últimos tempos em Portugal”.
“Obras desta envergadura (custou mais de 600.000 contos na nossa moeda) são raríssimas até mesmo nas nações grandes e ricas”, concluía o director do jornal.
*Lusa
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