segunda-feira, 9 de abril de 2012

Cultura e Tradições

Embarcações engalanadas cumpriram o ritual de homenagem a Nossa Senhora da Boa Viagem em Constância
Cerca de 200 marítimos e meia centena de embarcações engalanadas cumpriram hoje em Constância o ritual de homenagem a Nossa Senhora da Boa Viagem, padroeira dos pescadores e das gentes ribeirinhas. Situada na confluência dos rios Tejo e Zêzere, Constância celebra secularmente a segunda-feira da Boa Viagem como sendo o seu feriado municipal, uma festa que decorre dentro de água, com o desfile fluvial e bênção dos barcos, e com a participação de embarcações representativas da quase totalidade dos municípios ribeirinhos do Tejo, desde Abrantes até ao mar. Luís Calisto, 87 anos, cumpre a tradição de marcar presença com o seu "Adamastor", numa tripulação trajada a rigor e que surge composta também pelo seu filho, ambos de Praia do Ribatejo, "para dar uma ajuda e continuar com isto", até quando as forças já não derem para mais. "Venho aqui desde os meus 60 anos e não perco uma edição, pela amizade entre todos e pela alegria de acompanhar Nossa Senhora da Boa Viagem", contou, em declarações à Lusa. Trajado ao modo das épocas de então, lembrando os tempos em que os rios eram estradas e deles vinha o ganha pão de grande parte da população, António Lopes, de 65 anos, assegurou não ter perdido "uma única" festa de Constância, "pela devoção" à padroeira. "Os meus pais também eram pescadores e eu próprio digo que nasci dentro de um barco. Eram tempos muito difíceis e rezávamos a Nossa Senhora da Boa Viagem para que nada de mal nos acontecesse", lembrou. "É um modo de estar e é um modo de vida, faz parte da gente", notou. Em declarações à agência Lusa, Matias Coelho, assessor cultural da Câmara Municipal de Constância, disse que a festa "criou rotinas e sai sempre bem na fotografia", aludindo aos cortes orçamentais na ordem dos 60 por cento para a edição deste ano e lembrando um histórico de 250 anos de homenagem à padroeira dos marítimos. "A maior parte das pessoas ligados aos rios vem aqui todos os anos e no seu calendário mental todas as segundas-feiras de Páscoa são um dia de viajar para Constância, trazer o seu barco, abençoá-lo e rever amizades", observou. "É um ritual de vida", reforçou ainda, tendo observado que "há pessoas que só se veem de ano a ano e que transmitem a tradição de geração em geração". Máximo Ferreira, presidente da Câmara Municipal de Constância, disse à Lusa que "a importância maior do êxito das festas está no povo, que delas se apropriou e delas não abdica, apesar de qualquer decreto governamental que venha em sentido contrário". O autarca, emocionado, assegurou que os cortes orçamentais "são para continuar" nos vários eventos culturais concelhios, como as Pomonas Camonianas, de homenagem a Luís Vaz de Camões, numa lógica de "recordar, preservar e amplificar a cultura de um povo" e o património imaterial. "Importa agora retirar ensinamentos desta evocação de memórias para resistirmos ao presente e podermos seguir em frente, de cabeça erguida", rematou.
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